terça-feira

se acaso pousares o olhar nas asas de um anjo, tudo ficará suspenso. quisera eu, erguer-me como se erguem as mãos dos homens em direcção ao céu. o fascínio dos astros irrompendo por uma noite escura, a beleza das cintilações, a entrada do tempo hasteando a existência invulgar de pequenos luxos capazes de lavar a alma. vede como a lua está alta e, na sua anca, se debruçam minúsculos anjos perante a permanência intacta de melancólicas cidades e homens mal iluminados. afasta-te dessa dilatada amargura e de todos os subúrbios cortantes manchados de sangue. não tenhas medo. o medo é um lugar escuro que morre na violência com que o destróis. apesar de tudo, ainda és detentora da tua lucidez, enquanto o coração bater no interior do teu próprio casulo.


Luís-Carlos Mendes